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   O Crescimento de Crematórios no Brasil

Tanto no Brasil quanto no mundo, a cremação tem crescido significativamente nos últimos dez anos. Segundo os dados do Serviço Funerário de São Paulo, em 1995 houve 2837 cremações e, em 2007, este número saltou para 5286. Neste período dados apontam para um crescimento explosivo do número de crematórios no Brasil, ou seja, em 1997 havia somente três crematórios, em 2007, contabilizam-se 23 crematórios espalhados pelo país. (FOLHA DE SÃO PAULO, 24/02/2008)

Segundo Ariés (1982), compreender o modo como um povo concebe a morte e organiza seus rituais nos permite conhecer sua cultura e sua crenças a respeito desse fenômeno e, embora, a prática de inumar ainda seja predominante em nosso país, o aumento explosivo do número de crematórios nos últimos dez anos no Brasil, nos sinaliza sobre um campo de mudanças que vem se construindo na sociedade a respeito deste tema.

O Que Poderia Explicar esse Crescimento de Crematórios no Brasil?

Plagiando a campanha publicitária de uma marca de biscoitos, devemos nos perguntar: “o povo brasileiro aderiu à cremação porque tem mais oferta de crematórios ou temos mais ofertas de crematórios porque o povo brasileiro aderiu à cremação? Creio que nem uma, nem outra frase pode ser aplicada isoladamente.

Podemos supor que este “boom” de crematórios tem causas multifatoriais a acabam por produzir outros olhares sobre a morte e o morrer. Pretendemos eleger alguns desses fatores para pensarmos juntos nestas mudanças de hábitos do povo brasileiro no que diz respeito ao destino dado aos corpos e restos mortais.

• Fator Religioso

Um dos principais fatores que determina a escolha pela inumação ou cremação é a crença religiosa da família.

Devemos conceber a intrínseca relação morte-religião, sendo temas que não caminham em separado desde as épocas mais remotas até os dias de hoje, em todas as partes do mundo. Pensar sobre a relação do homem com a morte sem considerar o olhar religioso sobre ela seria ineficaz.

Em nosso pais, apesar da pluralidade religiosa, o catolicismo ainda predomina. Neste sentido temos que considerar que o Direito Canônico, código que regula as normas de vida da igreja católica, sempre proibiu o ato da cremação. Contudo em 1983, o papa João Paulo II fez reformulações no código, e passou a desaconselhar a cremação, e não proibi-la, o que pode ter repercutido em mais pessoas optando por esta prática.

Além disso, a própria pluralidade religiosa, já citada anteriormente, também garante a presença de religiões que não proibem a cremação e influenciam assim, seus adeptos.

• Fator Ambiental

Nunca, em nenhum outro momento da história, o destino dos corpos foi tão amplamente discutido com o enfoque ambiental como tem sido nos dias atuais. Este é um fator que pode ser considerado uma das molas propulsoras das mudanças gradativas do modo como nossa cultura tem lidado com o corpo morto.

Devo ressaltar que em tempos de repensar a relação do homem com o planeta, bem como as formas e usos que possam contribuir ou prejudicar o ambiente no qual vivemos, a influência da escolha do destino que daremos aos restos mortais sobre os resultados ambientais desta prática não pode ser descartado.

No caso de inumação, muito tem sido discutido sobre os efeitos da decomposição de corpos para o meio ambiente. Da mesma forma está sendo encarada a preocupação com os possíveis gases poluentes oriundos da cremação de corpos e restos mortais Embora ocorram divergências neste aspecto, muitas pessoas consideram a cremação um ato menos inofensivo ao planeta, se comparado à inumação, e optam por esta prática e defesa ao meio ambiente.

• Fator financeiro

Do ponto de vista financeiro, há quem defenda que para o cliente, a cremação é mais cara do que o sepultamento, mas sabe-se que em longo prazo o custo com o sepultamento é mais alto. Isso porque os restos mortais têm que ficar alocados no cemitério e para isso, compra-se um jazigo ou aluga-se, e acrescido o custo de manutenção, o pagamento torna-se contínuo.

Devemos pensar o custo e lucro também para os proprietários de crematórios. Neste sentido sabe-se que é preciso haver um determinado volume de cremação para que também haja margem de lucro, uma vez que aquecer o forno e manter funcionários para realizar apenas uma ou outra cremação, aumenta demasiadamente o custo e encarecendo o valor que chega ao cliente.

Desta forma, o fator financeiro pode beneficiar tanto o cliente quanto o proprietário, constituindo-se num item importante a ser considerado nesta análise.

• Fator Psicológico

Neste aspecto, muito temos a falar uma vez que esta é nossa área de estudo, nos deteremos brevemente aos fatores psicológicos porque pretendemos abordá-lo com mais ênfase no próximo texto que publicaremos.

O medo é a resposta psicológica mais comum diante da morte (KOVACS – 1992). Para HOELTER,J. (1979), o medo diante da morte é considerado uma reação emocional que pode estar relacionado à fatores distintos como, por exemplo, o medo de sentir o corpo depois de morto, o medo de que os que ficaram vivos venham a sofrer muito, medo de ser destruído, dentre outros. Em nossa prática de trabalho encontramos pessoas que optam pela cremação por medo de sentirem-se sozinhas no caixão, por medo de sentirem-se fechadas (claustrofobia), por medo de que seus parentes possam sofrer em visitas ao cemitério, etc. Há pessoas também que recusam a cremação por medo de terem seus corpos destruídos ou por medo de sentirem o ardor do fogo.

Conforme dissemos no início do texto, o “boom” de crematórios reflete uma mudança cultural na forma como o povo brasileiro vem lidando com a morte e com seus rituais.

Refletimos aqui sobre alguns desses fatores e no próximo texto, fecharemos mais nosso foco de análise e pensaremos quais os fatores que uma família considera nesta escolha. Não percam!


* Ana Lúcia Naletto e Lélia de Cássia Faleiros são psicólogas do Centro Maiêutica e desenvolvem trabalhos na área de apoio ao luto em cemitérios, crematórios e funerárias. www.centromaieutica.com.br



Referencia Bibliográfica:

- ARIÈS, Philippe. O homem diante da morte. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1982.
- KOVÁCS, Maria Júlia. Morte e desenvolvimento humano. São Paulo, Casa do Psicólogo, 1992.
- NALETTO, A.L.(2008) Produção Científica: Monografia de conclusão do curso de Aprimoramento em Teoria, Pesquisa e Intervenção em Luto, Instituto Quatro Estações, São Paulo, SP.





Fonte: Maiêutica


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