Detalhes tão pequenos, como diz a famosa canção, são coisas muito grandes para quem faz questão de tudo perfeito. É o seu caso? Se a resposta é sim, em vez de esperados elogios, você merece um bom puxão de orelha. É que a auto-exigência exacerbada gera tamanha tensão que, mais cedo ou mais tarde, o feitiço vira contra o feiticeiro: em vez da superação, vem a paralisia, provocada, pura e simplesmente, pelo receio de falhar. Os perfeccionistas inveterados têm uma idéia irreal do que seja um desempenho aceitável e por isso vivem insatisfeitos, analisa o psicólogo canadense Gordon Flett, da Universidade York, especialista no assunto. As conseqüências podem ser desastrosas.
Essas pessoas protelam as tarefas, refazem-nas inúmeras vezes e dificilmente conseguem concluí-las dentro do prazo. As relações pessoais também são prejudicadas. Cá para nós, é difícil lidar com gente que demora horas para tomar uma decisão, que não pode ver um objeto 1 milímetro que seja fora do lugar ou que é obcecada por minúcias sem a menor importância. E aí os conflitos são inevitáveis.
Ninguém sabe direito como surge o problema, mas especula-se que a raiz dele esteja tanto na genética como no ambiente familiar. Pode-se nascer predisposto à mania de perfeição, mas as expectativas paternas muitas vezes são o gatilho do perfeccionismo que vai se manifestar na vida adulta. Todos nós conhecemos casos de pais que projetam nos filhos o que eles próprios não puderam realizar. E aí aquela meta não atingida de concluir o curso superior, por exemplo, leva à exigência de que a criança seja a primeira da classe.
A tendência é que, anos mais tarde, essas pessoas tenham dificuldade de adaptação, sejam pouco flexíveis e fujam de desafios por medo de fracassar, avisa a psicóloga Mariângela Savoia, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo. O que fazer? Aprenda a respeitar as limitações e as escolhas individuais, responde o pesquisador belga Bart Soenens, com a autoridade de quem estudou o assunto. Mas essa lição, para um legítimo perfeccionista, não é nada fácil.
É bem provável que aqueles que teimam em buscar a perfeição não se dêem conta de que esse ideal é inatingível. Neles, a persistência gera frustração, seguida de uma sensação de desamparo, conclui Marilza Mestre. A auto-estima, lógico, é afetada. Pudera: o perfeccionista supervaloriza seus mínimos erros. E, por temer a reprovação alheia, esconde suas falhas, até mesmo as menores. Com essa atitude, ele fica sem saber o que outras pessoas diriam a respeito de seus deslizes. Se soubesse, perceberia que não são tão graves quanto imagina, lamenta o psicólogo Randy Frost, da Smith College, nos Estados Unidos, que pesquisou durante 20 anos os efeitos do perfeccionismo.
Não há consenso sobre até que ponto querer tudo perfeito é um traço de personalidade e a partir de quando isso passa a ser algo patológico. Às vezes, o perfeccionista percebe que seu comportamento está se tornando um problema, mas, geralmente, são a família e os amigos que o convencem a procurar ajuda, diz Mariângela Savoia. O assunto começa a ficar sério quando afeta a vida pessoal e a carreira. Em casos extremos, pode levar a um belo prejuízo físico e emocional.