- O Funeral"Quando as palavras forem insuficientes, crie um ritual" (Anônimo)
No texto anterior, vimos que o cemitério e toda sua equipe têm um importante papel no processo de luto. Muito mais do que guardar mortos, o cemitério guarda maridos amados, filhos queridos, mães fortes, amigos fiéis, namorados apaixonados, guarda as histórias vividas por aquelas pessoas enterradas. É um lugar que, embora seja marcado pela tristeza, guarda lembranças de momentos felizes. Daí a importância deste espaço para milhares de pessoas.
Neste texto, trataremos do
significado do funeral para o processo de luto. Nossa intenção é conscientizar os profissionais da área para o importante significado psicológico e cultural dessa cerimônia, que sempre foi um ritual realizado pelos homens para marcar a passagem da vida para a morte.
Desde a pré-história, nossos ancestrais da caverna se preocupam com as questões relativas ao funeral. Temos registros de que o homem mais primitivo já sepultava os seus mortos e realizava celebrações com flores, alimentos e outros utensílios.
È bom lembrarmos que funeral significa cerimônia de enterramento, pompas fúnebres, prestígio fúnebre. Assim como uma cerimônia de casamento possui um ritual de celebração com trocas de alianças, que marca simbolicamente a condição de solteiro para a nova condição de casado, o funeral também possui rituais de celebração.
As cerimônias e os rituais do velório e sepultamento, mesmo sofrendo variações de cultura, religião ou costumes familiares, são uma maneira de compartilhar a passagem da vida para a morte, de socializar a dor e iniciar um longo e doloroso processo de desvinculação para os familiares - conhecido como luto. Neste sentido, é o funeral que dispara o início deste processo, marcando concretamente esses acontecimentos, além de propiciar oportunidade para as últimas homenagens ao morto. É comum que morte sem corpo ou sem ritual de sepultamento, seja motivo de muitos complicadores emocionais para os familiares, o que nos confirma a importância do funeral.
De certa forma, podemos dizer que ao mesmo tempo em que os rituais fúnebres aproximam a família da dor da perda, eles também proporcionam uma segurança psicológica aos enlutados, na medida em que dão um direcionamento ao processo de luto, validando locais e momentos para a dor e o pesar.
Durante o funeral, podemos ver uma socialização do processo de luto onde, por meio de histórias contadas pelos familiares e amigos, ao redor no caixão, a vida de quem está partindo é reconstruída, para poder dar inicio ao enfrentamento do período de sofrimento daqueles que ficaram. A chegada dos parentes e amigos, os abraços e manifestações públicas de apoio também são de grande importância para o enlutado, que se sente desamparado nesta hora.
O Enfraquecimento dos Rituais na Vida Contemporânea
No mundo moderno, temos visto a cada dia a diminuição progressiva dos rituais de passagem. A supervalorização da individualidade e a ampliação da malha tecnológica colocam os rituais coletivos em franca decadência.
Em se tratando da morte, observamos que os familiares evitam cada vez mais toda e qualquer possibilidade de entrar em contato com a dor e com a morte, tendendo a um natural afastamento do corpo e dos rituais que acompanham este momento.
Os rituais do velório e do sepultamento podem se tornar rígidos ou vazios, dependendo do significado que a família dá a ele.
Podem ser realizados, muitas vezes, por uma convenção social e não por um significado particular, como, por exemplo, as visitas em dias de finados. Outras vezes são realizados de forma tão rígida e padronizada que não conseguem cumprir a função principal de ajudar o enlutado a expressar a sua dor de forma própria.
O Que Compete ao Segmento Funerário, Além do Simples Sepultamento de um Corpo?Temos acompanhado algumas inovações em produtos e serviços no segmento funerário, contudo, a maioria deles diz respeito mais ao consumo capitalista do que ao oferecimento real de um ritual de elaboração da perda.
Se os rituais são tão importantes, tanto no âmbito social quanto particular, o segmento funerário deve ter total atenção e zelo na realização dos mesmos. Para tanto, elegemos alguns cuidados que julgamos serem essenciais para aqueles que querem oferecer à seus clientes, um atendimento humano, ético e eficaz:
• Com o Ritual:-procurar atender os clientes nas diferentes manifestações culturais e religiosas, possibilitando, na medida do possível, todas as variações necessárias à realização do funeral.
- Proporcionar a possibilidade da família escolher se deseja prestar alguma homenagem especial ao falecido, oferecendo um toque particular ao momento.
- criar a possibilidade dos visitantes deixarem uma mensagem especial para a família ou registrar alguma lembrança da pessoa que faleceu.
• Com as Pessoas:- excelência no atendimento à família
- muito respeito ao corpo, uma vez que para a família aquele corpo inerte ainda está cheio de significado de vida.
- favorecer a socialização do processo de luto, criando um ambiente acolhedor para receber todos amigos e parentes da família.
• Com o Local: - respeito e zelo com a sepultura, entendida pela família como o local de repouso final daquele que se admira e respeita.
- prezar pelo silêncio, que simboliza a reflexão e homenagem àquele que não pode mais falar.
Fonte: Ana Lúcia Naletto e Lélia Faleiros Oliveira são psicólogas do Centro Maiêutica e desenvolvem trabalhos na área de luto em cemitérios, crematórios e funerárias.
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