Entre todas as mensagens que recebo regularmente, a que aparece com mais freqüência é: Raúl, como faço para vender mais? A resposta, obviamente, é um categórico depende .
Depende do posicionamento da empresa em relação aos concorrentes, depende da estratégia comercial, depende dos seus pontos fortes e fracos, depende dos recursos disponíveis, depende da sua vontade de realmente mudar.
Acontece que a maioria das pessoas que manda essas mensagens na verdade quer uma resposta fácil e rápida. Algo do tipo: como vender mais sem fazer força, sem mudar o que estou fazendo e, principalmente, sem me incomodar muito. Isso me lembra uma brincadeira que vi tempos atrás: um livro plastificado, com o título A vida sexual depois dos setenta anos . Aí você compra o livro e ele vem com todas as folhas em branco – essa é a vida sexual depois dos setenta. Um livro sobre como vender sem se adaptar ou sem fazer força seria mais ou menos a mesma coisa: um livro em branco, porque isso, simplesmente, não existe.
Tenho batido nesta tecla com insistência porque realmente estou alarmado com a precariedade intelectual das discussões comerciais que acompanho. Técnicas requentadas são apresentadas com repetição assustadora e quase nada de novo aparece no front. Palestras técnicas são boicotadas pelo público e pelos próprios organizadores, preferindo depoimentos emocionados, piadas e muito oba-oba motivacional. Tudo muito ótimo, mas a ressaca da realidade no dia seguinte é braba: a concorrência continua lá, cobrando preços menores, oferecendo mais vantagens, roubando clientes consistentemente. Todo mundo motivado, mas motivado para quê? Para continuar apanhando? Parecem os samurais do filme O Último Samurai, galopando motivadíssimos contra uma metralhadora giratória. E morrem todos, super motivados. E agora, José?
A resposta passa cada vez mais pela estratégia. Precisamos evitar os problemas e aprender a antevê-los, mas infelizmente nos tornamos um bando de profissionais acostumados a apagar incêndios e correr atrás do prejuízo. Planejamento estratégico, acho que concordamos todos, não é nenhuma panacéia milagrosa. Mas que ele precisa ser feito, com certeza precisa, porque a falta é muito pior. Só não pode confundir as coisas. O outro dia, por exemplo, ouvi o diretor de uma das maiores empresas de telecomunicações do país dizer que, para lidar com a concorrência, sua estratégia mudava todos os meses. Ora, isso não é estratégia. É tática, e olha lá.
Tem leitores que aqui já começam a bocejar e reclamar que a discussão está ficando teórica. O que eles querem são os truques de venda, a malandragem da negociação, o pulo do gato. Bobagem total. Quem não se preocupa com a teoria só pode ser um péssimo praticante, porque vai sempre errar ou acertar sem saber porque é que acertou ou errou. Aí as condições mudam e a pessoa não sabe o que fazer, porque simplesmente não entende o que aconteceu. Por isso tanta gente chega a um ponto da carreira e empaca. Por ignorância, pura e simplesmente. Por preferir o atalho braçal da prática ignorante do que a estrada intelectualmente árdua da teoria. Uma não é melhor nem pior do que a outra – precisamos das duas.
Empresas que não tem vantagem competitiva clara e sustentável acabam sempre tendo que lidar com os truques e malandragens para sobreviver. O que não está errado, se for no curto prazo. Entretanto, a longo prazo precisamos aprender a estabelecer regras e processos que permitam à empresa adaptar-se e oferecer aos clientes vantagens e benefícios significativos, com lucro.
Como estamos falando aqui de inovação, então analise como empresas inovadoras mudaram seus mercados e veja o que podemos aprender com elas. Pense na Gol Linhas Aéreas (eliminando intermediários, custos com lanches, etc.). Pense no Habib’s (quibe por R$ 0,99, promoções todos os dias). Pense no Magazine Luiza (dando poder e participação aos funcionários).
Por isso, gostaria de oferecer 4 questionamentos simples, mas muito sérios, que podem mudar toda a estratégia da sua empresa. Eles foram originalmente criados pelo professor do IMD N. Kumar e devem ser respondidos em grupo, de preferência com a participação do máximo possível das pessoas da sua equipe.
1)Porque fazemos negócios desta forma? Porque vendemos assim? Quais fatores do nosso ramo de negócio são considerados “imexíveis” mas poderiam ser questionados?
2)O que oferecemos para o cliente que tem custo alto mas o cliente não valoriza? Quais fatores poderiam ser cortados ou diminuídos sem grandes perdas?
3)O que o cliente realmente valoriza e deveria ser explorado/aumentado ao máximo?
4) Quais fatores poderiam ser criados como novidade – coisas que nunca foram feitas antes pela concorrência? Onde podemos realmente inovar?
Se você realmente quiser vender mais sem fazer força, só tem um jeito: com muita inteligência. Primeiro na visão teórica da estratégia, e depois na implementação prática. As respostas para as quatro perguntas acima podem ajudá-lo a mudar sua empresa, preparando-a estrategicamente para os próximos 10 anos. Sem truques nem malandragens.
Fonte: Raúl Candeloro é palestrante e editor das revistas VendaMais®, Crescimento Pessoal & Motivação® e Liderança®.