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   Medo Humano da Morte

Podemos também tentar evitar a idéia da morte afastando-a de nós tanto quanto possível - encobrindo e reprimindo a idéia indesejada. Ou quem sabe, assumindo uma crença inabalável em nossa própria imortalidade: "os outros morrem, eu não". De qualquer forma, acredito que devemos ser mais objetivos e menos complexos e encarar a morte como um fato de nossa existência.

A morte é um problema dos vivos. Os mortos não têm problemas. Entre as muitas criaturas que morrem na terra, a morte constitui um problema só para os seres humanos. Embora compartilhem o nascimento, a doença, a juventude, a maturidade, a velhice e a morte com os animais e plantas, apenas eles, dentre todos os vivos, sabem que morrerão. Na verdade, aprofundando um pouco a reflexão, pode-se afirmar que as plantas e os animais não são mortais porque não sabem que vão morrer, não sabem que têm que morrer: eles morrem, no entanto sem nunca conhecer sua vinculação individual, a de cada um deles, com a morte. As feras pressentem o perigo, se entristecem com a doença ou velhice, mas ignoram seu abraço essencial com a necessidade da morte. Não é mortal quem morre, mas quem tem certeza de que vai morrer. Os autênticos seres viventes somos só nós, os mortais, porque sabemos que deixaremos de viver e precisamos entender urgentemente que exatamente nisso consiste a vida.

Claramente não há uma noção, por mais bizarra que seja, na qual as pessoas não estejam preparadas para acreditar com devoção profunda, desde que lhes dê um alívio da consciência de que um dia não existirão mais, desde que lhes dê esperança numa forma de vida eterna. O encobrimento e o recalcamento da morte, isto é, da finitude irreparável de cada existência humana, na consciência humana, são muito antigos. Mas o modo do encobrimento mudou de maneira especifica com o correr do tempo. Em períodos anteriores, fantasias coletivas eram o meio predominante de lidar com a noção de morte. Ainda hoje, é claro, desempenham um importante papel. O medo de nossa própria transitoriedade é amenizado com ajuda de uma fantasia coletiva de vida eterna em outro lugar. Como a administração dos medos humanos é uma das mais importantes fontes de poder das pessoas sobre as outras, uma profusão de domínios se estabeleceu e continua a se manter sobre essa base.

A reflexão sobre a questão da morte revela que não é a morte que desperta temor e terror nas pessoas, mas a imagem antecipada da morte. Se uma pessoa caísse morta aqui e agora sem qualquer dor, isso não seria minimamente assustador para ela. Não estaria mais aqui, e, consequentemente, não sentiria o terror. O terror e o temor são despertados somente pela imagem da morte na consciência dos vivos. Para os mortos não há temor nem alegria.

A morte não é terrível. Passa-se ao sono e o mundo desaparece - se tudo correr bem. Terrível pode ser a dor dos moribundos, terrível, também, para muitas pessoas, é a perda sofrida pelos vivos quando morre uma pessoa denominada naquele momento de amada. Fantasias individuais e coletivas em torno da morte são freqüentemente assustadoras. Como resultado, muitas pessoas, especialmente ao envelhecerem, vivem secreta ou abertamente em constante terror da morte. O sofrimento causado por essas fantasias e pelo medo da morte que engendram pode ser tão intenso quanto a dor física de um corpo em deterioração. Aplacar esses terrores, opor-lhes a simples realidade de uma vida finita, é uma tarefa que ainda temos pela frente. Para a maioria das pessoas, é terrível quando pessoas morrem jovens, antes que tenham sido capazes de dar um sentido às suas vidas e de experimentar suas alegrias. É também terrível quando homens, mulheres e crianças erram famintos pela terra estéril onde a morte não tem pressa. Há muitos terrores que cercam a morte.

Talvez devêssemos falar mais aberta e claramente sobre a morte, principalmente para deixarmos de apresentá-la como um mistério. A morte não tem segredos. Não abre portas. É o fim de uma pessoa. O que sobrevive é o que ela ou ele deram às outras pessoas, o que permanece nas memórias alheias. Se a humanidade desaparecer, tudo o que qualquer ser humano tenha feito, tudo aquilo pelo qual as pessoas viveram e lutaram, incluídos todos os sistemas de crenças seculares e sobrenaturais, torna-se sem sentido.



Data de Publicação:  12/4/2006    Fonte: A semana online


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