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   O Deus das Pequenas Coisas

        Ele nasceu muitos milênios atrás, viveu sérios problemas familiares, tem milhares ou milhões (dependendo da contagem) de concorrentes e sua aparência não é exatamente o que se espera de uma divindade. Ainda assim Ganesh, o deus-elefante, superador de obstáculos e senhor das multidões, anda mais popular do que nunca: está no topo das preferências no concorridíssimo panteão do hinduísmo.

        No Ocidente, sua figura peculiar, robusta e rosada, confere-lhe status de ícone pop. "Ele é extremamente simpático, uma figura fofa", elogia a estilista Thais Losso, que já espalhou a imagem de Ganesh em itens que vão de sapatos a camisetas e tem uma miniatura dele no próprio quarto. Cabeça de elefante, corpo humano com barrigão à mostra, Ganesh (ou Ganesha ou Vighneshvara ou Vighnaharta, são quase 1.000 nomes) normalmente é representado com quatro braços e acompanhado de um ratinho. No sábado, quando começa na Índia o festival anual em sua homenagem, multidões sairão em procissão e farão sacrifícios. No final, imagens de até 6 metros de altura serão lançadas em rios e lagos (para desgosto dos ecologistas, que estão pregando a troca das tradicionais estátuas de gesso por representações de papel solúvel em água, menos poluentes).

        São muitas, como é inevitável na Índia, as lendas sobre o nascimento de Ganesh. A mais conhecida conta que a deusa Parvati, esposa de Shiva (que, com Brahma e Vishnu, forma a divina trindade hinduísta), queria ter um filho. Shiva refugou, e ela então moldou um com ungüentos perfumados e seu suor, dando origem ao belo Ganesh. Ao voltar para casa, Shiva viu o jovem de guarda no lugar onde Parvati tomava banho e, enfurecido, arrancou-lhe a cabeça. A mãe, compreensivelmente, se desesperou. Para reparar o erro, Shiva trouxe a cabeça do primeiro animal que encontrou pelo caminho e colou-a ao corpo. "Ganesh é uma divindade funcional, que recebe sacrifícios em momentos determinados, de acordo com a necessidade", explica o cientista da religião Frank Usarski, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Como uma espécie mais antiga e colorida de Santo Expedito, acredita-se que ajuda a vencer obstáculos, traz sorte e sucesso e é o patrono do conhecimento, da educação e da inteligência. É invocado sempre que a pessoa vai começar algo: uma viagem, um negócio, um relacionamento, antes de cavar um poço ou construir um templo. Enfim, os pequenos atos do cotidiano, que em qualquer religião são considerados simples demais para que se apele à divindade superior, mas que fazem a popularidade de intermediários simpáticos.


       
Fonte: Revista Veja - Edição 1872






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