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   Anjos e Demônios

        Aos poucos, enquanto caminha-se entre as 8.500 sepulturas do cemitério da Consolação, em São Paulo, o medo dá lugar à curiosidade. No local, pode-se optar por dois tipos de visita guiada: o roteiro histórico, passando pelos túmulos das celebridades, e o artístico, que leva a belas esculturas e obras de arte.

        Quem quiser, pode ainda conhecer somente túmulos de políticos – cerca de dez. Qualquer que seja a escolha, fica a impressão de que é impossível conhecer tudo num único dia.

        Inaugurado em 1858, o Consolação foi o primeiro cemitério municipal de São Paulo. Somente depois de sua abertura é que cristãos deixaram de ser enterrados em conventos e igrejas.

        O modernista Brecheret deixou obras memoráveis. Na mais conhecida, finalizada em 1923 para a família Penteado, o artista esculpiu uma Pietá com quatro Marias. A obra, intitulada Sepultamento, ganhou um prêmio especial numa mostra em Paris e, mais tarde, serviu de modelo para o Monumento das Bandeiras, de 1953.

        Do italiano também consta o jazigo da família Botti – O grande anjo – de feições humanas e asas que parecem separadas do corpo.

        Riqueza

        Artistas como Galileo Emendábile (1898-1974) e Nicola Rollo são recorrentes nas assinaturas dos túmulos. Rollo projetou uma das primeiras obras consideradas de temática profana em cemitérios, Orfeu e Eurídice, que remete à mitologia grega, o que não era comum quando foi idealizada, em 1920, para a família Trevisioli.

        Duas construções espantam pela imponência e riqueza de detalhes. O mais famoso mausoléu do cemitério, dos Matarazzos, é também o maior da América do Sul: ocupa 150 metros quadrados de terreno e, no ponto mais alto, chega a aproximadamente 20 metros de altura.

        A obra, feita em Gênova por Luigi Brizzollara (1868-1937) e trazida de navio para São Paulo, homenageia o filho do conde Francisco Matarazzo, Ermelino, que morreu numa corrida de carros.

        Outro que merece uma parada é o mausoléu da família Jafet, de Materno Garibaldi. Construído em 1932, tem várias simbologias, como o desenho de duas mulheres segurando uma pira de fogo se apagando, representação da vida indo embora.

       Reboco

        A suntuosidade do Consolação, no entanto, não exclui a simplicidade de túmulos como o do fundador da Universidade de São Paulo, Armando Salles de Oliveira (1887-1945), feito por Bruno Giórgi (1905-1993). A peça Oração representa duas mãos em prece.

        Entre tantos escultores, o cemitério abriu as portas para somente uma mulher mostrar o talento: Nicolina Vaz de Assis (1874-1941), considerada a mais importante escultora de sua época, que idealizou O selvagem, de 1898, para o túmulo de José Vieira Couto de Magalhães (1837-1898), último presidente da província de São Paulo.
No final, observe uma construção, da Sociedade Beneficente dos Chapeleiros, de autoria desconhecida e datado de 1880, provavelmente.

        Lá, estão muitos dos operários da antiga fábrica de chapéus João Alfredo, que ficava no Viaduto do Chá. Um mosaico mostra o desenho da fábrica ao lado de uma plantação de chá e do córrego Saracura, onde hoje fica o bairro do Bixiga. ‘‘Era comum enterrar os funcionários num mesmo mausoléu’’, afirma a diretora do Projeto Arte Tumular, da Prefeitura, Eliana Queirós. (A.C.S.)

       Fama

        Políticos e artistas juntos
        Oswald de Andrade e Mario de Andrade dividem com Monteiro Lobato, crítico contumaz dos modernistas, o mesmo solo do Consolação. O túmulo do ex-presidente Campos Salles, com esculturas à Auguste Rodin, está numa lista de tombamento da Prefeitura. Muito da conservação das histórias do cemitério da Consolação deve-se ao advogado e historiador Délio dos Santos. No dia 11 de maio, ele foi sepultado na terra à qual se dedicou a estudar. O cemitério fica na Rua da Consolação, 1.660. Visitas: (11) 3107-6449 e 3247-7078. Aberto diariamente, das 9 às 16 horas. (A.C.S.)

Fonte: A Gazeta - Vitória/ES






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