Direito
Funerário - Parte III
Responsabilidade Por Lesões Ao Jus Sepulchri
(Direito de Sepultar)
Aquele que em ato contrário ao direito, causas danos e
prejuízos ao titular de um direito sobre determinada sepultura tem o dever de
indenizar. Tanto pode ser a responsabilidade civil aquiliana do artigo 159 do Código
Civil Brasileiro, como responsabilidade contratual ou, ainda, responsabilidade
do Poder Público por ato administrativo danoso.
Se transeunte ingressa
no cemitério danifica ou destrói sepulcro,
tem o dever de indenizar. O mesmo se diga daquela que, construindo novo sepulcro ou restaurando velho, causa danos a outro já
existente, por descuido ou imperícia no manejo dos instrumentos de trabalho. São
hipóteses de responsabilidade.
Se o titular do domínio particular causa prejuízo a
sepulcros erigidos, tem o dever de indenizar e isto terá como suporte o negócio
jurídico enfitêutico.
Finalmente, se o Poder Público, por ato de seus
funcionários, causar danos a determinada sepultura ou sepulcro, há, da mesma
forma, o dever de indenizar. Se violar direito de sepultura, da mesma forma. O
mesmo se diga se terceiros furtam ou roubam vasos ou ornamentos (podem ser de
cobre, de prata e até mesmo de ouro) dos cemitérios públicos, tem o Poder Público
o dever de indenizar, pois lhe cabia o dever de polícia sobre o local.
No Brasil, o caso mais antigo que se conhece de pedido
de indenização por violação do jus
sepulchri foi aquele julgado pela 2ª Câmara do Tribunal de Justiça de São
Paulo, em 2 de outubro de 1928: ''Se, por ordem da administração do cemitério,
é demolida uma sepultura, em terreno pago pelos parentes ou herdeiros do
defunto, tem estes o direito ao ressarcimento dos danos causados, pouco
importando que em nome de terceiro tenha sido feito o pagamento das despesas com
a obtenção do terreno e sepultamento, pois, nessas ocasiões é sempre um
amigo quem se incumbe desse piedoso mister, e era ele inventariante do decujus
embora a outrem pertencesse a herança''.
Por ocasião da 1ª Câmara Civil do Tribunal de Apelação de São Paulo, em 24
de novembro de 1941; ''A Municipalidade de que, tendo concedido sepultura
perpetua, mais tarde manda demolir, alegando defeito de alinhamento, é obrigada
a reparar os danos causados pelo seu procedimento, porque o defeito de
alinhamento só pode ser a ele mesmo atribuído, desde que as construções dos
túmulos são feitas sob sua imediata fiscalização.
Uderico Pires dos Santos,
analisando este tema, com base em decisões dos Tribunais de Justiça através
de suas Câmaras Civis de Apelação, afirma que, quer ''quando a cova funerária
ou túmulo, onde os mortos são enterrados for constituída de jazigos perpétuos,
pertencentes a certas família, quer quando as sepulturas onde são enterrados
forem daquelas em que os restos mortais do defunto devem ficar por determinado
tempo estipulado pelas leis que regem a hipótese, ali eles deverão permanecer.
Quanto aos primeiros ad infinitum, ou
até quando os proprietários dos respectivos sepulcros os negociarem com
terceiros, que dali os removem. Já os enterrados nas chamadas covas rasas ali
deverão permanecer durante o tempo previsto nos regulamentos dos cemitérios.
Se forem retirados antes, as instituições que administram os recintos em que
os mortos são depositados respondem por danos morais e até materiais na
eventualidade de eles haverem sido sepultados com jóias, incrustações em
ouro, etc., sem que as mesmas sejam entregues aos seus familiares''.
Por fim, acrescenta: ''Sem dúvida alguma o cônjuge
sobrevivente, ou os filhos do de decujus, tem o direito de recolher, em sepultura particular que
edificarem em suas propriedades particulares, os restos mortais do finado,
depois de esgotado o prazo de seu sepultamento. Não podem, por isso, os
administradores dos cemitérios dar-lhes o fim que entenderem sem consultar os
familiares do exumado, salvo se ele foi enterrado como indigente e sem que se
tenha conhecimento do paradeiro de qualquer de seus ascendentes ou descendentes''.
Efetivamente, – continua o autor – ''guardar-se em sepulcros particulares os
retos mortais do defunto depois de decorrido o prazo temporal de sua permanência
nos cemitérios oficiais é um direito de seus familiares, esse direito não
pode ser violado.Se for, o responsável por sua quebra responde civilmente, pois
é conhecido o princípio de que deve ser indenizado todo e qualquer dano que
alguém sofrer''.
Vale aqui ressaltar recordando o que já fora dito que,
se existissem jóias e outros objetos valiosos com o defunto, a indenização
abrangeria dano material, caso contrário, deve ela constituir-se em dano moral.
Como ressaltou o acórdão, no caso subjudice, é aqui
neste terreno que o dano moral se apresenta como o indicado para paradigma de
hipótese de sua aplicação. A dificuldade residiria na fixação do valor da
indenização, porque o art. 1.541 do nosso Código Civil diz que, havendo
usurpação ou esbulho do alheio, a indenização constituirá em se restituir a
coisa, mais o valor das determinações, ou, faltando elas, em se embolsar o seu
equivalente em dinheiro (art. 1543 do C. C. B).
Em razão dessas dificuldades, Pires dos Santos aponta
a seguinte alternativa: ''Se o autor do evento tiver meios para restituir os
restos mortais retirados à revelia dos familiares do morto a coisa se tornará
fácil. Mas que não dispuser de meios para tal o perito terá de atribuir
subjetivamente o valor da afeição dos lesados, fornecendo o quantum
da indenização, que poderá ser uma importância que lhe permita mandar
rezar missas pela lama do defunto durante certo tempo e até mesmo para indenizá-lo
dos gatos que tiveram, erigindo um sepulcro particular para depois de exumados
os restos mortais de seu familiar, ali os recolherem''
Outra solução viável, é a de determinar, tendo-se em conta a posição do
falecido enquanto vivo, a construção de um cenotáfio em sua honra. A localização
ficaria a critério do Prefeito Municipal, que poderia erigi-lo na própria necrópole,
ou então, até mesmo em praça pública, caso tivesse prestado relevantes serviços
aquela comunidade de que se trate.
Como exemplo de ato de irresponsabilidade de prepostos
da Municipalidade, cita a autora deste artigo
o caso onde um jazigo perpétuo do cemitério de uma cidade de São Paulo
foi violado, sendo destruído singelo túmulo e exumado os restos mortais que
ali repousavam, e que foram, sem formalidades, removidos para o ossuário comum
da necrópole, permanecendo vago o antigo sepulcro.
Em decorrência desse fato, a família a qual pertencia
aqueles restos mortais ingressaram com ação cominatória contra a Prefeitura
Municipal visando obter a reconstrução da sepultura e a recondução à mesma
dos despojos mortais.
A sentença de primeiro grau julgou pela procedência,
condenando a Municipalidade a erigir, em trinta dias, no mesmo local, túmulo
coletivo ao que fora destruído, sob pena de, decorrido dito prazo sem o
cumprimento da determinação, incidir em multa diária. Entretanto, negou,
indenização por perdas e danos e deixou de determinar a recondução dos
despojos do corpo exumado, face à impossibilidade física de sua identificação
no ossuário, junto aos demais ossos ali existentes.