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   Falando Sobre a Morte Com Crianças

        Conversar com crianças sobre assuntos sérios sempre foi e continua sendo um tabu para muitos adultos. Mas vários estudos na área de psicologia e educação vêm ajudando pais e adultos em geral sobre a melhor maneira de enfrentar aquela pergunta ‘’fatal’’. Da mesma forma que o velho conto da cegonha é inadmissível em resposta à curiosidade da criança quanto a seu nascimento, não é aceitável, ao se falar da morte, que se invente histórias. Também neste caso, dizer a verdade é a melhor solução.

        Em síntese, é o que diz o médico e cirurgião plástico mineiro Evaldo A. D’Assunpção em um dos capítulos do seu mais recente livro, ‘’Dizendo Adeus – como viver o luto para superá-lo’’. O autor é especialista em tanatologia, ciência que estuda a morte e que, como trabalho psicológico, procura atender os enfermos portadores de doenças terminais e aos familiares, ajudando-os a vivenciar seus últimos dias e a superar a perda de uma pessoa querida. Ele também é membro de uma associação norte-americana voltada ao estudo da educação para a morte ( Assotiation for Death education and Counceling – USA). Com outros quatro livros publicados em torno do assunto, tem se dedicado ainda a dar palestras sobre como superar o luto.

        Evaldo D’Assumpção defende a importância de se falar com  as crianças sobre a morte sempre  que aparecerem oportunidades para isso. Inclusive fala que, quando morrer alguém da família, não se deve privar a criança de participar dos ritos fúnebres, a não ser que ela não queira ir. ‘’Mesmo nesses caso pode-se procurar conversar com a criança, explicando-lhe o que aconteceu e, quem sabe, ela decide mudar de idéia e participar do velório e sepultamento. É muito importante a sua preparação prévia para o que vai encontrar’’, diz.

        Segundo ele a criança até 5 anos de idade não têm condições de reconhecer a morte como algo irreversível e universal. Também não são capazes de distinguir a diferença entre aqueles que morrem (seres vivos) e aqueles que não morrem – um boneco, por exemplo. Já entre os 6 e 9 anos, elas compreendem a irreversibilidade da morte e fazem essa distinção. ‘’Por isso, é mais fácil conversar com elas sobre a morte. Após essa idade já existe uma compreensão quase completa do que é a morte’’, diz.

        Evaldo fala que, diante de uma perda, as crianças percebem que alguma coisa aconteceu. ‘’A agitação dos adultos, as conversas e o choro são sinais bastante claros. Elas farão perguntas, as quais deverão ser respondidas sem mentiras, de modo claro e compreensivo para as suas respectivas idades. Também é muito importante não se estender em demasia, especialmente falando sobre coisas que não foram perguntadas’’.

        ‘’Para descobrir o que uma criança quer saber’’ – orienta – ‘’uma boa maneira é devolver a ela as perguntas que fizer. Se pergunta: ‘O que é morrer?’, em vez de imediatamente começarmos uma complicada preleção, podemos perguntar: ‘O que você acha que é morrer?’ Dessa maneira será possível descobrir o que ela já sabe, procurando-se então, apenas adequar a realidade ao que ela já estará imaginando. Nunca se deve mentir ou fantasiar.’’

        Ao receber a notícia do falecimento de uma pessoa querida, a criança apresentará períodos de negação – recusa a acreditar nesse fato; raiva – revolta por ter perdido uma pessoa querida; negociação – pensa que pedindo a Deus, ele irá devolver-lhe a pessoa; interiorização – fica silencioso pensando no que aconteceu; e, finalmente de aceitação do fato. Segundo Evaldo, são exatamente as mesmas fases pelas quais passa o adulto.

        Evaldo D’Assunção fala da importância de se conservar as crianças junto dos adultos no velório. Mas se neste momento elas resolverem brincar e até se divertir, os adultos não devem se aborrecer e nem repreendê-las. ‘’Isso será totalmente inadequado, pois as brincadeiras costumam ser a melhor maneira que as crianças encontram para lidar com a ansiedade e o medo da morte. Se elas estão brincando, é porque a vida continua.’’

  Renegar a Idéia da Morte Pode Ser Pior

        Se desde pequena a pessoa é educada para entender a morte, vai suportar mais facilmente a perda de um ente querido. Por outro lado, o impacto pode ser devastador em quem nunca teve a oportunidade de conversar francamente sobre o assunto.

        A bibliotecária Márcia Santiago, 24, sabe muito bem disso. Até os 8 anos de idade, antes de perder o pai, uma tia e a avó paterna em um acidente de carro que ainda deixou a mãe hospitalizada, ela praticamente não tinha ouvido ninguém em casa pronunciando a palavra morte, muito menos conversando sobre o assunto. O pai guardava um verdadeiro pavor da morte e ela, sempre muito medrosa, evitava o contato com o assunto de todas as formas. ‘’Se passasse algum filme que tivesse morte no meio, eu não via. Então não sabia o que era a morte...E até hoje não quero saber.’’

        Quando aconteceu a tragédia, Márcia precisou fazer tratamento psicológico durante dois anos, ela e a irmã mais nova, que na época tinha 6 anos. Não queria aceitar a perda dos familiares e, principalmente, a do pai, a quem era muito ligada. Hoje, reconhece que se tivesse sido educada para entender melhor a morte, teria sofrido menos.

        O acidente aconteceu em uma sexta-feira e a notícia da morte foi dada à Márcia e à irmã um dia depois. ‘’Primeiro, disseram do acidente mas falaram que estava tudo bem. Aí a gente desceu e foi brincar. Quando voltamos, todo mundo ainda estava na sala. Foi então que o meu tio e os padrinhos da minha irmã disseram o que realmente tinha acontecido. Falaram que Papai do céu tinha levado meu pai pra morar com ele. Perguntei se ele voltava, disseram que não e que um dia todos nós iríamos morar lá com Papai do céu também’’, lembra Márcia.

        A estudante de jornalismo Luciana Tito, 24, tinha 2 anos de idade quando perdeu a mãe, por isso não lembra de como recebeu a notícia. Nem mesmo sabe se recebeu. Só passou a sentir mais o peso dessa ausência quando foi crescendo, por conta também de datas especiais, como o Dia de Finados e o Dia das Mães.

        Há seis anos, Luciana teve que dar a notícia do falecimento de um parente próximo ao primo de 3 anos. O menino tinha um contato diário com a bisavó e sabia que ela estava doente. ‘’Falei que vovó tinha ido para um lugar melhor. Ele perguntava sempre pela bisavó e a gente dizia que ela estava no céu, olhando para ele. Perguntava também se o cachorro Ralph estava lá.’’

A Hora da Verdade

        * Deverá ser explicado à criança que aquela pessoa que ela gostava e via sempre alegre e brincando, e que agora está morta, vai ficar imóvel dentro de um caixão. Que a sua pele estará fria porque nos mortos o sangue que aquece o corpo não está mais correndo nas veias. E que, por isso também, sua pele estará muito branca, às vezes até um pouco azulada.

        * Se a criança pedir para tocar o corpo, não se deve negar. Pelo contrário, ela deve ser inclusive ajudada se for muito pequena. Se ela perguntar se a pessoa  a está escutando, deve-se dizer que sim, porém de uma maneira diferente da que estamos acostumados a ouvir. E que ela saberá quem lhe falou.

        * Se perguntar se a pessoa sente dor, se sentirá medo de ficar sozinha e no escuro do caixão e na sepultura, deve-se explicar toda a verdade: quem está sendo sepultado já não é a pessoa que você conheceu. Ela transformou-se num espírito – como os anjos – e agora está numa situação bem diferente da nossa. O que está no caixão é só o corpo que ela tinha. Assim, ela não sente dor, não tem medo e não ficará no escuro.

        * Tudo o que for sendo explicado deverá ter uma confirmação: ‘’Você entendeu?” Em caso negativo, pergunte o que não foi entendido para que se procure explicar novamente, numa linguagem mais compreensível para a criança.

 

 

Matéria retirada do ''Viver Melhor''

Informativo do Grupo Vila Nº 7 – junho/julho de 2001 - Natal/RN






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